sexta-feira, 23 de novembro de 2012

CASOS E CAUSOS - 2ª EDIÇÃO




APRESENTAÇÃO

A 2ª edição do livro “Casos e Causos: um encontro da cultura popular”, elaborada pelos alunos do Liceu de Quixeramobim Alfredo Almeida Machado e professores do Laboratório Escolar de Informática, vem contribuir sobremaneira para a valorização de nossa cultura local. A ação educativa faz parte agora do Projeto Jovem de Futuro e conta com recursos do Ministério da Educação para seu financiamento.
Foram meses de pesquisas feitas pelos alunos, com pessoas residentes na sede e distritos do município de Quixeramobim, buscando o que nosso município tem de pitoresco ao se valorizar os relatos orais de nossos moradores.
Deve-se também atentar para o trabalho de ilustração de nossos alunos, com desenhos que representam bem o imaginário das histórias contadas.
O livro apresenta 24 contos, os quais exploram o imaginário local, com um toque de humor, bem típico das histórias contadas no Ceará. O resgate de tal tradição é fundamental para que nossas histórias não se percam e para que nossas tradições não sejam esquecidas.
Todo esse trabalho resulta em alunos comprometidos com sua história. Além disso, desenvolve-se também a expressão oral e escrita, essencial para sua aprendizagem e futuro.
Parabéns a todos que estiveram presentes na realização desta brilhante produção!

Ivonildo da Silva Reis
Coordenador Pedagógico do Liceu de Quixeramobim



Prefácio
Quem nunca ouviu nenhuma história de Trancoso ou alguma história de assombração e/ou mistério? Quem nunca se deleitou em noites sombrias ou de luar do sertão, ou até mesmo numa noite urbana em que faltou energia elétrica com uma história de homem ou mulher que virava bicho ou com uma casa assombrada na rua de trás? Quem conta um conto aumenta um ponto. E quem conta um causo suscita, ou ressuscita outro causo. Pode até ser repetido um causo, mas quando é contado sempre há um detalhe novo. Nunca é contado da mesma forma, sempre há uma fantasia a mais, mais intensa. É isso que não deixa morrer as memórias orais que agora, através deste livro, são registradas; é a linguagem, a forma de contar que por muitas vezes não deixa o causo repetitivo, mas inovador, inovado. Palavras como “marmota”, “visagem” e títulos como “O estalado da macaca” de imediato nos remetem à literatura fantástica, à literatura oral que ouvíamos nossos pais e avós contarem e aguçam a curiosidade até de quem não gosta de ler. As ilustrações colaboram para levar o leitor à imaginação, criação ou recriação do cenário em que se sucedeu o causo. É um verdadeiro e fantástico exercício de memória. Imagine caro leitor, o quanto os entrevistados se sentem honrados ao verem suas histórias, reais ou não, registradas para que as futuras gerações possam ler e se deleitar daqui a anos e, daqui a anos estas memórias estarão mais vivas do que nunca. Portanto, não deixemos morrer este pilar de nossa identidade cultural, não deixemos de ler; deixemos que seja resgatada nossa cultura popular, nosso imaginário, nossa fantasia, nosso folclore e, consequentemente, um pouco de nossa história também. Avante! Deixe a fantasia fluir e a imaginação viajar no tempo e nas memórias. A literatura é, literalmente, pra comer! Bon appetít!

João Paulo Barbosa da Silva
Professor



CASOS E CAUSOS: UM ENCONTRO DA CULTURA POPULAR
2ªEDIÇÃO

ESCRITORES:

Ivyna Dryelle Fernandes Patrício
Hiago Silva Souza
Marcio Estenio Pimentel Cavalcante
Jhully Pereira de Lima
Mirian Campelo Dantas
Alex de Sousa Paiva
Ana Marcia de Silva Melo
Marcelo Ferreira Gomes
Marcelo Augusto Alves Silva
Ives Franco Viana
Ruddo Lopes Neuman
Matheus Ferreira da Silva
Ana Estela Oliveira Lima
Daniel da Silva Medeiros
Bruna Maria Felipe Severo
Magda Silva Freitas

ILUSTRADORES:

Felipe Rodrigues da Silva
Antonio Filho da Silva Ribeiro
Leticia Mara da Costa
David Silva do Couto
Francisco Kelleton Ferreira Macêdo
Regilene Santos Rodrigues
Mikele Alves de Sousa
Matheus Ferreira da Silva
Rodrigo Barros Leal

PROFESSOR REVISOR:
Ivonildo da Silva Reis

PROFESSORES COLABORADORES:

Patrícia Saldanha Vasconcelos
João Paulo Barbosa da Silva
Gustavo de Costa Oliveira
Alba Marília Lima Cruz




O CORNO E O TREM



Conta-se que na década 60 aconteceu o primeiro crime de que se tem registro no Bairro Depósito, em Quixeramobim. Durante muitos anos, a locomotiva do trem estacionava no depósito e, toda noite, a máquina produzia um estranho barulho que fazia; “teco, teco, teco”... Um senhor de idade não muito avançada residia perto do estacionamento e escutava este barulho diversas vezes antes de dormir. Em uma certa noite, o barulho soou diferente. Para ele, o irritante barulho de “teco, teco, teco estava dizendo “corno, corno, corno”, isso o deixou extremamente incomodado, quase enlouquecido.
Ao amanhecer, o senhor se lenvantou de sua cama e andou atordoado de um lado para o outro, questionando-se como pudera sua esposa ter lhe traído. Agindo por implulso, foi até a cozinha onde a mulher preparava o café, pegou a mão de pilão repentinamente, atacando-a com um golpe mortal. A mesma veio a falecer de imediato.
O assassino saiu de casa desesperado e os vizinhos acionaram a policia em seguida, o homem foi detido.
Na prisão, ele começou a ouvir ora o som da locomotiva, ora as vozes que bradavam a suposta traição de sua esposa. Extremamente confuso e enlouquecido, meses depois, cometeu suicídio.



A CRIATURA DA SERRINHA DE SANTA MARIA



No múnicipio de Quixeramobim, há décadas, um certo morador chamado Antônio andava como de costume pela região. De repente, depara-se com um ser desconhecido e por curiosidade resolve ir até ele para ver o que seria.
Quando ele se aproxima, encontra um bicho muito estranho, com aproximadamente um metro de altura. Quando percebe a presença do seu Antônio, a criatura foge desesperadamente daquele local.
Passados os dias, o Sr. Antônio logo começa um relacionamento. Noivou, casou-se e teve filhos. Tempos depois, alguns moradores daquela região comentaram sobre um suposto ser que andava criando caos por ali.
A aparição estava matando os animais e bebendo o sangue das galinhas e porcos.
Certo dia, os moradores escutaram o alvoroço dos cachorros que brigavam com um bicho muito estranho, dele ouviam-se uns sons como se fossem uns sinos pequenos. Logo depois, ele foge mata a dentro. Seu Antônio pega sua espingarda e vai atrás do mesmo, levando seus cachorros. Andando na mata, ele acaba encontrando o ser. Os cachorros entraram dentro de um olho d'água e o atacaram, mas não conseguiam deter o bicho.
A solução foi seu Antônio disparar um tiro com sua espingarda. Logo depois de ser atingido, a criatura saiu correndo em direção aos pés de seu Antônio, onde veio a morrer.
Os moradores, ao ouvir o disparo do tiro, correram imediatamente para o local. Chegaram lá e logo se espantaram, pois sua aparência física parecia com a de seres humanos, sua orelha, seus pés e sua sobrancelha. Os braços eram colados ao peito, sua curvatura era côncava e em seu corpo não existia a presença de pêlos.
Eles levaram o corpo do desconhecido e o puseram em cima de um formigueiro,mas as formigas não o devoraram, nem os urubus o desejaram, acabou se decompondo apenas com o calor do sol.
Depois desse ocorrido, muitos tentaram sem sucesso descobrir o que era o ser estranho da Serrinha de Santa Maria.


ORAÇÃO DE PARIDEIRA


No tempo em que as mulheres tinham os filhos nas suas próprias casas, com as famosas parteiras, o risco era muito grande tanto para a criança quanto para a parturiente. Sabendo disso, as mulheres se agarravam com todo tipo de mezinhas e orações.
Era muito conhecido no interior do Ceará, um velho que vagava de cidade em cidade, num cavalo alazão, levando uma bendita e famosa oração “parideira”. Onde o velho chegava, já ansiosamente aguardado; era uma festa para as mulheres prenhas do lugar.
Mas o velho tinha as suas exigências. Além de boa hospedagem e alimentação para ele e seu cavalo, ninguém podia mexer na trouxinha de pano, pendurada num cordão, onde era embalada a milagrosa oração e nem ele dizia o que lá estava escrito.
Na hora do parto, bastava a parturiente colocar o poderoso artefato no pescoço e pronto, a criança nascia sem nenhum problema, saúde boa para mãe e filho e tudo bem. Sorte ou não, sempre dava certo e a oração do velho ficava cada vez mais famosa e requisitada.
Mas num belo dia, uma das amigas de uma parturiente, aproveitando-se da distração do velho, resolveu abrir a trouxinha para ver o teor da oração e quase morre de espanto.Estava escrito, em quase ilegível caligrafia: “Comendo eu e meu cavalo alazão, pouco me importo se essa mulher vai parir ou não!”


A PEDRA DA VISAGEM¹


Na localidade de Curralinho, em Quixeramobim, existia um homem chamado Francisco de Assis; o mesmo possuía uma moto e adorava uma aventura em alta velocidade. Sempre ao vir à cidade, ele tinha o costume de andar acima de 100km/h; era muito conhecido pelo seu jeito louco de pilotar.
Em um certo dia, voltando da cidade, já próximo de casa, derrapou e acabou tendo uma morte horrível, quebrando o pescoço, sem chance alguma de sobrevivência, pois vinha em altíssima velocidade. Seu corpo caiu sem vida, próximo a uma pedra, manchando-a de sangue.
Depois de sua morte, muitos moradores dizem ouvir vozes no local, e quando os motoristas passam a noite, sempre avistavam um homem, vestindo roupas brancas, no meio da estrada, próximo à pedra. Por este motivo, a pedra ficou conhecida como Pedra da visagem.


A PERNA CABELUDA



Uma história muito inusitada aconteceu nos anos de 1980, em Quixeramobim. Tudo começou quando um radialista chamado Carlos Salvador noticiou que um casal de namorados que se abraçavam em frente ao cemitério foram assustados por uma misteriosa perna cabeluda.
A notícia logo se espalhou pela cidade e, a cada dia, o locutor anunciava mais uma aparição da perna cabeluda. Muitas dessas aparições aconteciam no bairro da Maravilha. Tal fato causou espanto e medo de quase toda população, que evitava sair de casa com medo da assombração.
Com o tempo, surgiram várias versões sobre o assunto. Há boatos de que havia sido descoberta que a perna cabeluda não passava de uma fraude feita por um homem usando peles de animais. Mas há também quem acredite que tudo era real.


NAS PROSAS DA BERILÂNDIA, EXISTE O HOMEM-CACHORRO


Entre as décadas de 1950 e 1960, quando se juntavam as senhoras, lá em Berilândia, um interior pacato do município de Quixeramobim , era costume se passarem tardes inteiras tomando-se um cafezinho, até o sol se pôr, conversando, contando as suas histórias, passadas de geração em geração.
Porém, havia uma senhora chamada Marieta, que contava, em forma de prosa, uma história bem peculiar, falava que lobisomem de verdade não existia, o que era verdadeiro se chama o homem- cachorro. Este foi um pobre coitado, amaldiçoado pelo seu destino, que, quando criança, recebeu uma mordida de um cão, com alguma doença daquelas “brabas”. Desde então, sentia mais vontade de ser cachorro do que homem. A família, com medo do pior, viu que não tinha jeito; abandonou-o em umas matas distantes dali. Mas o menino voltava, todavia, e batia na porta dos pais. Então eles decidiram ir embora e nunca mais apareceram.
O menino cresceu, virou um homem, e como imaginado, sim, ele virava um cachorro, grande, com dentes enormes, mas ele tinha algo só dele, é que só se transformava em dia de festas. Podia ser dos coronéis do Riacho Valentim ou dos roçadores de Berilândia, ele sempre aparecia, ficava escondido entre as matas, via as meninas e as criancinhas. Sua vontade era de atacá-las e matá-las, mas algo não o deixava cometer este ato.
Muitos tinham medo dele, achavam que era um assassino brutal. Quando aparecia alguém morto, naquelas matas, já diziam: “Foi ele, o homem-cachorro”. Era tão aterrorizante para as crianças, que D. Marieta falava para os seus filhos ficarem quietos, se não, dizia que iria chamar o homem- cachorro.
Mas em um certo dia, foi encontrada a verdade sobre esta pobre criatura. Ele morreu, mas não de tiro, nem de facada, morreu de fome, por nunca ter tido coragem de matar ninguém. Com ele encontraram uma carta, dizendo:
Todos nós temos um lado bom e um lado mau, uns utilizam de boas atitudes, para ter retorno de algo, o que já lhe faz uma pessoa não muito boa, outros utilizam do mau para ser melhor do que os outros, o que lhe faz uma pessoa pior ainda, mesmo tendo um monstro dentro de mim, jamais matei alguém, porque entre o bem e o mal, eu fico com a paz de todos nós.
E assim se foi, o homem-cachorro, um monstro diferente de todos os outros que você já ouviu falar. Esse dá uma lição de vida para os moradores daquela localidade, mostra que devemos buscar sempre ser do bem e da paz, em todas as situações que a vida vier a nos oferecer! Mas cuidado, ele pode apenas querer ter morrido como bonzinho, e pode ainda estar por lá, nas mesmas matas, latindo forte em noites de festa, e causando medo em quem passa pelo interior da Berilândia!